5.24.2011

A Paisagem em Movimento

Vivemos um quotidiano em que não pudemos dar nada como certo. O mundo acelerou de tal forma que nos sentimos zonzos com o excesso de velocidade, informação, acontecimentos, mudanças sociais, económicas, tecnológicas, etc.

Já em “The Future”, Leonard Cohen cantava a sua ansiedade por um mundo mais estático, onde soubéssemos o que poderíamos esperar, mesmo que mau.

“Give me back the Berlin wall
give me Stalin and St Paul
I've seen the future, brother:
it is murder. “

Mas chegou a vez dos parques naturais também cantarem, juntando-se ao coro feminino de Cohen.

Foi publicado o relatório sobre o papel das alterações climáticas nas dinâmicas das áreas de conservação (Climate change threatens European conservation areas, que pode ser lido aqui).

Apesar de à escala humana as alterações resultantes nos poderem parecer relativamente lentas, à escala dos ecossistemas esta será uma transformação rápida, que já em 2080 poderá determinar que uma grande parte das reservas naturais delimitadas pela Rede Natura 2000 já não esteja no mesmo sítio, ou seja, ter-se-ão deslocado para outras latitudes, resultado da alteração das associações de vegetação e de todas as espécies animais ligadas a estas.

Transcreve-se aqui parte do sumário em português do texto, publicado no blog Ambio.


Mudança nas políticas de conservação
Segundo os autores do estudo é necessária uma alteração de fundo nas políticas de conservação na Europa, já que estas não consideram as consequências das alterações climáticas na abundância e distribuição das espécies. O carácter fortemente dinâmico da distribuição das espécies, num contexto de alterações climáticas, poderá forçar uma revisão do estatuto actual de algumas áreas protegidas e induzir a classificação de novas áreas. Também se sugere o aprofundamento de mecanismos de gestão integrada da paisagem de modo a facilitar a mobilidade das espécies entre áreas protegidas. “Ainda hoje vigora a ideia de que as estratégias de conservação implicam o isolamento das áreas protegidas face a factores de ameaça externos. Porém, para que sejam eficazes, estas áreas devem mitigar os efeitos das alterações climáticas além de proporcionar uma gestão sustentável dos habitats e ecossistemas locais”. Segundo Miguel Araújo, seria importante rever os mecanismos de gestão das áreas protegidas de modo a contemplar planos para períodos de 20 a 50 anos em função da velocidade das transformações em cada ecossistema. Estes planos deveriam ser revistos regularmente e ser concebidos a escalas relevante para minimizar os impactes do clima.

Pode-se também ler o sumário completo, em português, aqui.

O fenómeno não é novo, e já foi estudado por diversas vertentes científicas, especialmente por estudiosos de paleoambiente ou paleoecologia. Tal como as árvores do Senhor dos Anéis, a vegetação sempre se deslocou, lentamente, pelos caminhos e áreas mais favoráveis, conforme o clima e outros constrangimentos lhe permitia.

O problema actual, com as alterações climáticas em curso, será o de imaginarmos como podemos contornar o facto da fauna e flora repovoarem novas áreas. Será mais ou menos como imaginarmos que toda a flora e fauna que se considera importante conservar, poderá, dentro de 70 anos, deslocar-se 50 km para norte. Esta transformação põe em causa toda a política de conservação, pois esta assenta na mumificação de uma área restrita, marcada a caneta num mapa, e não num sistema dinâmico, em constante alteração e permuta. E se no passado, fauna e flora podiam-se deslocar de uma forma mais ou menos livre, com as transformações massivas realizadas pela urbanização, florestação e agricultura, a sua deslocação será muito mais difícil e rarefeita, pois a colonização de novas áreas irá coincidir, certamente, com usos intensivos do território, pelo menos no litoral português.

Give me back the Berlin wall

1 Comentários:

Blogger Tiago Saraiva disse...

Quando a resposta está na 'gestão integrada', fica-se logo de pé atrás. Ai a nossa REN...

4/7/11 21:40  

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