10.18.2009

Totoro

No final do ano passado, a National Geographic alertava para o declinio de um importante ecossistema agrícola de nome “Satoyama”, uma das mais felizes associações entre homem e natureza no Japão. A imagem inequívoca do trabalho nos campos de arroz não faz juízo ao papel da natureza na construção e subsistência desta unidade de paisagem. Debruçada sobre as terras baixas, uma floresta frondosa contribui de forma significativa para a fertilização dos campos, revelando-se simultaneamente um elemento fulcral no dia-a-dia das populações como fonte de alimento, construção e aquecimento.
Como razão, a busca de uma nova urbanidade: novas habitações, fábricas e campos de golfe. Todo um passado ancestral deitado fora em prol do progresso numa região em que soam ecos de uma revolução económica dos países vizinhos. Hayao Miyazaki tomava como ponto de partida para a sua alegoria “Tonari no Totoro” (1988), a paisagem de “Satoyama”. No filme, duas crianças protegidas pelo pai, aproveitam a sua ausência diurna para prospecções nas terras que rodeiam a sua casa. Fazem amizades com os camponeses dos campos de arroz e com amigos imaginários (ou não) que se escondem entre as imediações do lar e o grande canforeiro.
Nas obras de Myazaki, de forte componente ecológica, a dualidade homem/natureza é uma constante, mas nunca surge representada desta forma. A tensão que se sente na maioria da sua restante cinematografia dá aqui lugar a uma calmia, com base no forte equilíbrio deste sistema. Um equilíbrio que não tem correspondência nos dias correntes.
Na série televisiva de 1978 “Conan, o rapaz do futuro”, também obra de Miyasaki, o autor, que tende a antecipar-se no que diz respeito aos fenómenos naturais, ou melhor, de natureza humana, previa metaforicamente para 2008 uma terceira guerra mundial. Tal não aconteceu. Nesse ano, 2008, anuncia-se sim o estado regressivo do equilíbrio da paisagem de Satoyama.



Hoje, se fosse filmado 21 anos depois, o filme não seria o mesmo. O “autocarro-gato” levaria consigo não só Totoro bem como toda a fauna ameaçada, para nunca mais voltar.

1 Comentários:

Blogger claudia ávila gomes disse...

Sim senhor, gostei :)

30/10/09 17:42  

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