4.17.2006

eflúvio magnético

(23 de Fevereiro a 29 de Abril)

A tempestade de neve é uma das coisas do mar que menos se conhecem. É o mais obscuro dos meteoros, obscuro em todos os sentidos da palavra: é uma mistura de nevoeiro e tormenta; é um fenómeno que ainda nos nossos dias não se percebe bem. Provém daí muitos desastres.
Há quem queira explicar tudo no vento e na vaga. Ora no ar há uma força que não reside no vento, e na água uma força que não reside na vaga. Esta força, a mesma no ar e na água, é o eflúvio. O ar e a água são duas massas líquidas, pouco mais ou menos idênticas e entram uma na outra, pela condensação e pela dilatação, de tal modo que respirar é beber; só o eflúvio é fluido. O vento e a vaga são apenas impulsos. O vento manifesta-se pelas nuvens, a vaga pela espuma; o eflúvio é invisível.

Victor Hugo, O Homem que Ri, in Eflúvio Magnético, nº1/3

Victor Hugo descreve n’O Homem que Ri um fenómeno meteorológico que ocorre no mar e que é causado por uma variação no pólo magnético do planeta. A tormenta dissolve num só substracto o vento e a vaga em manifestações que resultam, inevitavelmente, na morte de todos aqueles que as presenciam – o Eflúvio Magnético. Desse fenómeno apenas fica o resíduo do náufrago.


Coluna de Colombo
Fotografia a cores, 125 x 125 cm, 2006

O princípio do mecanismo científico baseia-se na análise de dados adquiridos e processados a partir observação de fenómenos mas o eflúvio, por ser inexplicável, por todos os seus observadores serem de modo infalível aniquilados, falha na explicação científica e qualquer descrição movimenta-nos, necessariamente, para a ficção e para o hipotético. Daí que a manifestação do eflúvio se torna indefinível e o conceito fica como que suspenso perante esse indizível. “Digamos que o Eflúvio apresenta o devir como inconsistente, ou faz a apresentação dessa inadequação do movimento à paralisação conceptual.” (JMG+PP, in Eflúvio Magnético, Vol. 1/3 pp.11) Neste sentido, o interesse deixa de residir no eflúvio e na sua explicação mas no facto de o fenómeno ser interdito ao conhecimento.


O Encapuçado
Fotografia a cores, 95 x 135 cm, 2004

O Eflúvio Magnético é o projecto trifásico de João Maria Gusmão e Pedro Paiva (JMG+PP), cuja segunda parte termina a 29 de Abril no edifício da Galeria Zé-dos-Bois. Nele é abordado “o levantar da questão, a tradução de como o evento se prende, por definição à situação eventural e se apresenta como Sítio fora-do-sítio (...) e operar uma persistência que legitima a sua veracidade. Quando exposto à sua questão existencial o evento exibe-se no (des)aparecer.” (JMG+PP, in Eflúvio Magnético, Vol. 2/3 pp.30).



O Homem Evasivo
Fotografia a cores, 180 x 180 cm, 2006

Acompanhando as três fases deste projecto foi lançada uma revista homónima que apresenta algumas das “excursões semifilosóficas, semiliterárias” do Eflúvio Magnético. Para esta fase foi também publicado um artigo no último número da NADA, actualizado o site e está a decorrer um ciclo de cinema no Aquário da Zdb. Deste, ainda a saber: The Falls de Peter Greenaway (19 de Abril); The Heart of Glass de Werner Herzog (20 de Abril); L’Age d’Or de Luís Buñuel (26 de Abril); El Topo de Alexandro Jodorowski (27 de Abril); Selecção de Curtas-Metragens de Georges Méliès (29 de Abril), sempre às 22:00.


Anomalia Marítima
Fotografia a cores, 180 x 220 cm, Serra da Estrela, 2006


Cinemática (o hipnotizador de troncos)
Fotografia a cores, 180 x 200 cm, 2006