5.27.2011

Corredores verdes?

É sempre das situações mais insuspeitas que surgem as novidades mais espantosas.

Quantos poderiam apostar que seria da cultura da guerra, do controle, da vigilância, do ódio, ou da própria guerra-fria que surgiria um dos mais ricos e extensos corredores verdes da Europa? Entre torres de vigia, vedações intransponíveis, arame farpado e minas, a natureza tratou de criar o que o homem já provou que, por sua vontade própria, dificilmente consegue.

Na fronteira entre as duas alemanhas, na anteriormente conhecida cortina de ferro, um corredor com cerca de 1400km de extensão e 3683ha de área, desenvolveu-se um dos mais ricos e extraordinários corredores ecológicos, que contêm cerca de 100 tipos de habitat e 5000 espécies presentes (600 das quais em risco de extinção, muitas das quais já se consideravam mesmo extintas). O corredor funciona como uma comprida linha de distribuição de fauna e flora ao longo da sua extensão, enriquecendo em biodiversidade os diversos locais por passa.

Este corredor ecológico, surgido em 1949, teve como principal origem o seu abandono e provável vazio legal após o fim da separação alemã, tendo sido parcialmente reconhecido como uma importante área de preservação a partir de 1990. Actualmente, o projecto European Greenbelt, tenta formalizar o seu estatuto proteccionista e alargar a sua área de protecção. A sua sobrevivência já se mostra difícil, pois começam a surgir os projectos de estradas e de interesses comerciais.


Tal como nos diz o manifesto da Terceira Paisagem, de Gilles Clement, se o homem não realizar qualquer tipo de acção, a paisagem, por si só, contêm mecanismos de evolução biológica que permitem transformar a inacção humana em algo de importante e interessante para a biodiversidade.

E foi exactamente o que aconteceu. Nesta pequena faixa, conhecida como um corredor da morte e com pouco mais de 30 a poucas centenas de metros de largura, repleta de minas, impedimentos físicos e muito medo, a pressão humana foi mínima durante décadas, não se tendo construído edifícios e estradas, não se tendo agricultado ou florestado. O resultado é uma espécie de versão animada e real do livro vermelho europeu.

A questão que se pode levantar deste exemplo, é até que ponto é que não conseguimos realmente coexistir com a biodiversidade. Podemos também perguntar-nos se não seria mesmo mais útil determinar verdadeiros corredores ecológicos, sem pressão humana, em vez de nos cansarmos com projectos “sustentáveis” e leis (e alterações à lei), que tentam minimizar o impacte humano, sem realmente o conseguir.


Outra questão que também se pode colocar é até que ponto a localização de um valor natural é absolutamente essencial para a biodiversidade existir. A separação entre as duas alemanhas poderá até coincidir com algumas determinantes biofísicas (rios, lagos, acidentes de relevo, etc.), mas devemos desconfiar da capacidade de planeamento ecológico de Estaline, Churchill e Truman, assim como das acções de restauro ambiental da Stasi e da polícia federal alemã. Parece-me que o factor essencial para a biodiversidade ter-se mantido ao ponto deste corredor ser considerado um santuário foi a inacção. A evolução biológica, com os seus mecanismos próprios, conseguiu por si só adaptar-se e expandir-se a este traçado político-militar, criando uma dinâmica que muitas reservas e parques provavelmente não possuem.

Que dizer, quando com toneladas de arame farpado e minas se consegue criar um dos melhores e maiores corredores verdes do mundo?

5.24.2011

A Paisagem em Movimento

Vivemos um quotidiano em que não pudemos dar nada como certo. O mundo acelerou de tal forma que nos sentimos zonzos com o excesso de velocidade, informação, acontecimentos, mudanças sociais, económicas, tecnológicas, etc.

Já em “The Future”, Leonard Cohen cantava a sua ansiedade por um mundo mais estático, onde soubéssemos o que poderíamos esperar, mesmo que mau.

“Give me back the Berlin wall
give me Stalin and St Paul
I've seen the future, brother:
it is murder. “

Mas chegou a vez dos parques naturais também cantarem, juntando-se ao coro feminino de Cohen.

Foi publicado o relatório sobre o papel das alterações climáticas nas dinâmicas das áreas de conservação (Climate change threatens European conservation areas, que pode ser lido aqui).

Apesar de à escala humana as alterações resultantes nos poderem parecer relativamente lentas, à escala dos ecossistemas esta será uma transformação rápida, que já em 2080 poderá determinar que uma grande parte das reservas naturais delimitadas pela Rede Natura 2000 já não esteja no mesmo sítio, ou seja, ter-se-ão deslocado para outras latitudes, resultado da alteração das associações de vegetação e de todas as espécies animais ligadas a estas.

Transcreve-se aqui parte do sumário em português do texto, publicado no blog Ambio.


Mudança nas políticas de conservação
Segundo os autores do estudo é necessária uma alteração de fundo nas políticas de conservação na Europa, já que estas não consideram as consequências das alterações climáticas na abundância e distribuição das espécies. O carácter fortemente dinâmico da distribuição das espécies, num contexto de alterações climáticas, poderá forçar uma revisão do estatuto actual de algumas áreas protegidas e induzir a classificação de novas áreas. Também se sugere o aprofundamento de mecanismos de gestão integrada da paisagem de modo a facilitar a mobilidade das espécies entre áreas protegidas. “Ainda hoje vigora a ideia de que as estratégias de conservação implicam o isolamento das áreas protegidas face a factores de ameaça externos. Porém, para que sejam eficazes, estas áreas devem mitigar os efeitos das alterações climáticas além de proporcionar uma gestão sustentável dos habitats e ecossistemas locais”. Segundo Miguel Araújo, seria importante rever os mecanismos de gestão das áreas protegidas de modo a contemplar planos para períodos de 20 a 50 anos em função da velocidade das transformações em cada ecossistema. Estes planos deveriam ser revistos regularmente e ser concebidos a escalas relevante para minimizar os impactes do clima.

Pode-se também ler o sumário completo, em português, aqui.

O fenómeno não é novo, e já foi estudado por diversas vertentes científicas, especialmente por estudiosos de paleoambiente ou paleoecologia. Tal como as árvores do Senhor dos Anéis, a vegetação sempre se deslocou, lentamente, pelos caminhos e áreas mais favoráveis, conforme o clima e outros constrangimentos lhe permitia.

O problema actual, com as alterações climáticas em curso, será o de imaginarmos como podemos contornar o facto da fauna e flora repovoarem novas áreas. Será mais ou menos como imaginarmos que toda a flora e fauna que se considera importante conservar, poderá, dentro de 70 anos, deslocar-se 50 km para norte. Esta transformação põe em causa toda a política de conservação, pois esta assenta na mumificação de uma área restrita, marcada a caneta num mapa, e não num sistema dinâmico, em constante alteração e permuta. E se no passado, fauna e flora podiam-se deslocar de uma forma mais ou menos livre, com as transformações massivas realizadas pela urbanização, florestação e agricultura, a sua deslocação será muito mais difícil e rarefeita, pois a colonização de novas áreas irá coincidir, certamente, com usos intensivos do território, pelo menos no litoral português.

Give me back the Berlin wall

Concurso para o Castelo de Buñol


A revista Paisea está a promover o concurso para o acesso ao castelo de Buñol, para estudantes dos cursos de arquitectura paisagista e profissionais com menos de 40 anos (jovens, supõe-se!).

As inscrições estão abertas até 31 de Maio de 2011 e a apresentação de propostas é até 29 de Julho de 2011. Os prémios são vários e vão desde € € € para os primeiros 3 classificados e 4 menções honrosas, até receber a colecção completa da Scape da GG. O prémio mais importante será para o vencedor, que poderá tornar realidade o que imaginou.

Ver tudo aqui: http://www.paisea.com/concurso/

Mãos à obra!

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