9.28.2006

Arte e Paisagem

Amanhã e depois (29 e 30) apresenta-se o Colóquio Internacional Arte e Paisagem, organizado pelo Instituto de História de Arte da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. O programa dos dois dias de trabalhos é dos mais interessantes apresentados dentro destes contornos em Portugal (só eventos muito, mas muito pontuais têm polvilhado aqui e ali de forma interessante a discussão sobre paisagem).
Pintura, fotografia, escultura, arquitectura, cinema, literatura, dança, performance, design, video, cenografia e algumas das suas relações com a paisagem vão ocupar-nos durante os próximos dias.

Alguns dos autores visados:

Bill Viola
«The Passing»


Arne Jacobsen; Alison & Peter Smithson; Sverre Fehn


Jorge Colombo «Fall 03»

9.22.2006

Tortoise



No universo dos discos que fazem a nossa vida, a sugestão de paisagem parece surgir quase sempre associada à letra de uma canção, ao título de um álbum ou a uma simples imagem impressa numa capa. Por vezes conhecemos ou reconhecemos sítios, cidades, quando ao ouvido nos cantam uma letra vezes sem conta. Acabamos por formular uma imagem da mesma, a qual, incompleta, não corresponderá claramente à realidade, mas ao que imaginámos ou idealizámos a partir dela.
Noutro campo e longe da música dita “do mundo”, existem músicos que dificilmente conseguimos dissociar de uma determinada cidade ou lugar. Numa abordagem contemporânea, assimilam as especificidades locais para, a partir destas, imporem uma música global, mas que só aos mesmos pertence.
Nos Tortoise, não existem letras, apenas instrumentais. Não existe uma clara alusão a sítios ou lugares mas, na verdade, desde o início que a sua música nos desloca aos locais mais longínquos. Se por vezes, uma música demasiado cerebral nos transporta para paraísos artificiais, é clara a procura de uma certa espacialidade em alguns dos seus temas. Numa faixa podemos ser transportados para o frenesim da cidade, noutra para o mais bucólico dos campos. Mas também auto-estradas, lagos gelados, aeroportos, caminhos de ferro, estações hidroeléctricas, pontes, penhascos, florestas outonais, num sem número de imagens que sobrepostas geram algo que transcende a sua própria música.
São de Chicago mas poderiam ser de outro sítio qualquer.
Acabam de lançar a retrospectiva “A Lazarus Taxon” (Thrill Jockey, 2006), compilação de singles, raridades, vídeos e lados b.

9.19.2006

Paisagem da Democracia


Spiral Jetty de Robert Smithson (Great Salt Lake 1970) por David Maisel

A Associação Portuguesa de Arquitectos Paisagistas [APAP] celebra 30 anos de actividade numa altura em que se prepara mais uma tentativa de passagem a Ordem de Arquitectos Paisagista. Assim, realiza-se no Porto entre 12 e 14 de Outubro o Congresso Nacional da APAP que aproveita o facto de ter quase tantos anos como a democracia em Portugal para reflectir sobre a posição da arquitectura paisagista na sociedade portuguesa. Com este congresso, pretende-se também elaborar uma Declaração para a Sustentabilidade da Paisagem Portuguesa.
A pedido de Maria Carvalho do Núcleo de Arquitectura Paisagista do Porto - Planear - divulgamos o blog (temporário?!...) Paisagem da Democracia que pretende acompanhar e divulgar os trabalhos e as celebrações dos 30 anos da APAP.



9.05.2006

Água no Asfalto (ou as poças do terrapleno de Santos)

O vasculhar destas velhas fotografias e a publicação deste post deveram-se a dois factores: o primeiro os festivais de música que têm passado pelo terrapleno de Santos e o segundo a falta de precipitação e o enorme calor que levam as autarquias, por ignóbil ignorância, regar os múltiplos relvados (cada vez mais e maiores) nas horas de maior calor e sem evitarem as constantes regas do asfalto das estradas.

O terrapleno de Santos é o resultado de uma tomada de decisão na década de 40 de acordo com as necessidades definidas como primordiais para o desenvolvimento estratégico da Lisboa ribeirinha e da posição que se queria que Lisboa tivesse nas rotas da navegação comercial, locais e globais.

A sua construção consiste num aterro sobre o Tejo que geometriza a frente ribeirinha e aumenta a profundidade de navegabilidade junto a essa frente facilitando a acostagem de barcos maiores. A superfície desse aterro foi revestida com asfalto.

Esse tapete era, inicialmente, homogéneo, perfeito, regular. A passagem do tempo foi sempre contrariada com a incessante procura em reduzir as acções entrópicas no asfalto. Dessas tentativas restam alguns vestígios das cicatrizes asfaltadas que acabaram por transformar a superfície em vários retalhos.

O actual abandono do terrapleno, espectante até quando e como (?...), permitiu a restituição da face temporal à camada asfáltica que imprime as primeiras irregularidades da superfície. As pequenas depressões e falhas no asfalto, praticamente imperceptíveis em tempo seco, adquirem, durante as chuvas, uma enorme presença. Após elevadas precipitações surgem do nada manchas e linhas reflectoras. O espaço e o tempo como se multiplicam nestes reflexos.

Uma superfície, que inicialmente se queria controlada, reparte-se agora em inúmeras perspectivas sintomáticas da actuação do sistema hidrológico sobre a topografia do asfalto. As manchas reflectoras são as marcas do diálogo entre a topografia asfáltica e a precipitação. Formam-se mini-bacias hidrológicas: festos e talvegues. A erosão associada ao escoamento superficial da água aumenta e pequenas plantas começam a surgir onde há aglomeração de sedimentos e de água.

Os suiços Vetsch Nipkow Partner AG, em vez de escamotear a face temporal da superfície, optaram por a regular. No projecto Sulzerareal Winterthur, os VNP definem pontos de retenção da água precipitada tornando a relação entre a superfície e a precipitação um elemento do projecto. Perde-se, no entanto, grande parte da surpresa que encontramos no terrapleno de Santos. A relação entre as duas variáveis é totalmente definido e denunciado e não deixa espaço para o imprevisível. Parece-me que o Homem tem tido no seu percurso dificuldades em lidar com o aleatório.


fotografias VNP

A 14 de Agosto saiu um comunicado no site da Administração do Porto de Lisboa [APL] onde se declarava terem sido assinados dois protocolos válidos por 10 anos com vista à concessão do armazém existente no terrapleno de Santos para ser transformado num espaço multiusos, chamaram-lhe «entertainment center». No primeiro protocolo, celebrado com a Venue – Gestão de Espaços e Eventos, está previsto duas salas de concertos, um estúdio para eventos promocionais e artísticos e um espaço para ensaios de bandas. O segundo protocolo celebrado com o Chapitô prevê um espaço, o Chapitô-Rio, para ensaios, espectáculos, leitura e exposições. «Ambos os contratos contemplam a subordinação às necessidades que venham a declarar-se no âmbito da actividade portuária desenvolvida pela APL prevendo a possibilidade de alteração do ordenamento terrestre e fluvial da zona. Assim, mais uma vez se constata que a APL está determinada em continuar a conciliar com sucesso a movimentação de mercadorias, o turismo de cruzeiros, os desportos náuticos a cultura e o entretenimento, dotando a cidade de mais uma infra-estrutura que a aproxima do Tejo.»