8.18.2006

Perspectiva I





No séc XV, Piero della Francesca, escreveu um tratado sobre perspectiva e aplicou esses conhecimentos na sua pintura. A perspectiva central é uma construção mental em que as linhas que formam um espaço convergem para um ponto imaginário, o ponto de fuga. Este ponto define a linha do horizonte e coloca o Homem, vertical, no centro dessa visão.
No séc. XXI, o Google Earth providencia-nos outra linha de visão, o zénite e o centro da Terra. O Homem já horizontal, orbita à volta da terra e domina essa superfície. Mas em vez de uma superfície homogénea, as imagens do Google Earth surgem-nos focadas no centro e desfocadas na periferia, criando assim a ilusão perdida da perspectiva, a ilusão de profundidade. Esta perda de visão periférica assemelha-se ao tipo de conhecimento que obtemos no motor de busca Google. Conhecimento à volta de um termo, em vez de conhecimento sobre uma matéria.
As imagens mostradas centram-se no Maryon Park, em Woolwich, Londres, onde foi filmada a cena do crime no filme Blow-up do Michelangelo Antonioni. Neste filme, um fotógrafo de moda, a partir de uma fotografia tirada no parque a um casal que passeia numa clareira, repara que algo de estranho se passa na sebe que a limita. Começa a ampliar a imagem até à exaustão, até que descobre um assassino com pistola. Mas fica no ar a hipótese de engano. Com o G. Earth aproximamo-nos desta clareira em voo picado.

8.02.2006

Casas#1

Um lote longilíneo inserido no seio de um tecido urbano familiar aos povoados de pequena dimensão (Santa Vitória, Beja) é rematado por uma casa existente “com uma porta entre duas pequenas janelas”. A extensão do espaço habitado resulta da reconfiguração do vazio do logradouro através da presença ou ausência de cobertura. Quando presente, acolhe espaços diferenciados na sua função. Na sua ausência dá lugar a pátios, vazios comunicantes com o céu e a casa nos seus diferentes compartimentos. O uso de materiais resume-se ao betão da cobertura, os blocos de cimento visíveis das paredes e a cal sobre o betão dos tectos.

O cliché less is more ultrapassa aqui a mera síntese formal, por vezes ancorada numa parafernália de aparatos tecnológicos, para numa economia de materiais e de meios, dar lugar a uma realidade bem mais próxima do essencial. Daí o seu encanto.

O projecto é da autoria do Arquitecto Rui Mendes. O presente texto e respectivas fotografias surgem a partir de um artigo redigido no “Jornal dos Arquitectos JA223”, número subordinado ao tema Escassez.